domingo, 5 de dezembro de 2010

Momentâneamente Sem Ar

Nada vale o esforço que se faz. Eu não mereço esse mundo e essas pessoas justamente pela reciprocidade disso: eles não me merecem. Tanto o mundo como as pessoas. Sigo tentando por que sou teimoso e até orgulhoso. Não vou dar o braço a torcer. Não, não vou. Não vou procurar o penhasco com uma corda enrolada no braço. Não vou lhes dar esse gostinho. Vou continuar sugando o oxigênio e exalando o gás carbônico do mundo e farei o mesmo com as pessoas; sugarei seus defeitos e os transformarei em flores. Mesmo que isso, depois, me renda a dor que sinto no momento. Eu não pedi o ar que respiro e a vida que tenho, assim como não pedi pra você me inspirar essas coisas. Se eu exalo o gás carbônico é por que tenho necessidade de tal mecanismo pra me manter vivo e se escrevo sobre você, bom, digamos que é por que preciso disso me manter vivo, também. Sinto-me sufocado, no momento. Você cortou o meu ar, me deu um soco no estômago, me fez engasgar, encheu meus olhos de lágrimas. Eu não pedi isso. Eu não precisava disso. Não precisava de agradecimentos, nem de louros, nem de congratulações. O ar não precisa falar essas coisas. Se eu deixar de existir, ele continuará por aí. O ar não precisa dedicar-se unicamente à mim. Assim como você. Agora, preciso de aparelhos pra respirar e aqui, nesse deserto, não há nenhum. Sinto-me em outro planeta, como um astronauta sem sua roupa espacial, respirando os gases venenosos, desviando de plantas carnívoras, sufocado, perdido, olhando pro céu, pro espaço, para as estrelas, esperando ajuda, esperando uma abdução, esperando uma cápsula voadora, um asteróide assassino, um vento de peste negra pra acabar com isso de uma vez; extinguir a lenta e repetitiva agonia de viver com ar escasso, com um ar traiçoeiro carregado de substâncias maléficas pro meu lânguido organismo. Até quando, isso, assim, dessa forma? Se eu não fosse tão orgulhoso e teimoso, eu revisitaria a possibilidade de sair qualquer dia desses com uma corda enrolada no ombro procurando uma árvore bem bonita pra me pendurar. Mas você vai ter que me engolir enquanto eu respirar. E enquanto você for o ar que eu respiro.